Entretenimento tem riscos à saúde
Publicado em 26/10/2020 - 17:44 Por Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro
Um estudo feito entre agosto e setembro deste ano pela empresa de base tecnológica de pesquisa Hello Research para a organização não governamental (ONG) Proteção Animal Mundial (WAP, do nome em inglês) apurou que 60% dos 200 turistas brasileiros consultados reconhecem riscos associados ao entretenimento com animais silvestres.
A pesquisa teve como base a indústria de delfinários, que envolve a exibição de golfinhos e outros mamíferos marinhos, mas, de maneira geral, traz um olhar mais amplo sobre como as pessoas enxergam a manutenção em cativeiro de animais em geral, disse hoje (26) à Agência Brasil o gerente de campanhas da WAP, João Almeida.
Foram analisados os perfis e percepções de turistas brasileiros que, em 2019 e neste ano, viajaram ou têm intenção de viajar, nos próximos três anos, para destinos com delfinários, que são parques e atrações destinados à exibição de golfinhos e outros mamíferos aquáticos.
De acordo com João Almeida, o estudo oferece várias camadas de interpretação do problema. Do ponto de vista mais individualista possível, percebe-se que as pessoas estão mais preocupadas com a saúde própria do que com o problema dos animais em cativeiro, que são usados nesse tipo de entretenimento. Isso significa que seis em cada dez brasileiros entendem que o contato próximo com animais silvestres traz riscos de transmissão de zoonoses, isto é, risco de as pessoas ficarem doentes.
Ele lembrou ainda os problemas de manter animais silvestres em cativeiro, "vivendo uma vida inteira de sofrimento”. Segundo Almeida, esse tipo de indústria turística explora em todo o mundo 550 mil animais em condições de cativeiro.
O estudo da WAP mostra que 56% dos entrevistados que consomem tal tipo de entretenimento sabem do risco de transmissão de doenças no contato do ser humano com animais selvagens, seguidos por 42% que conhecem parcialmente o risco e 1% que não acredita ou não sabe. Os dados evidenciam que as pessoas estão mais preocupadas em resolver os interesses individuais de viajar e fazer alguma coisa divertida do que combater o comércio desses animais.
Indagados sobre a participação em atrações de entretenimento com animais selvagens, 30% disseram que procurariam se informar para saber o risco real de fazer parte de uma atração como essa; 23% que participariam, mas tomariam alguns cuidados para se preservar, como manter uma distância segura; e 6% afirmaram que não tomariam nenhuma precaução.
Para Almeida, ao promover tais shows, a indústria de golfinários busca gerar "lucros em cima do sofrimento dos animais silvestres”. Essa indústria, com as devidas proporções, viabiliza a aproximação entre animais silvestres e seres humanos, contribuindo assim para que exista um risco aumentado da transmissão das zoonoses, acrescentou.
João Almeida considerou que a pandemia do novo coronavírus, com a disseminação da covid-19, é um momento “positivo” para as pessoas se tornarem mais sensíveis como um todo, porque perceberam que há problemas em explorar a vida silvestre em condições de cativeiro, em que os animais ficam deprimidos e estressados e passam a ser organismos fontes de muitos patógenos que podem saltar dos animais para os seres humanos.
“A indústria de turismo também mimetiza essas condições”. Isso ocorre também na caça esportiva, na indústria de moda e com os pets (animais de estimação), que exploram a vida silvestre em busca de lucro, sem olhar para as questões de sofrimento animal, de zoonoses e riscos para a saúde e a economia”, disse o gerente da WAP. Nos últimos 30 anos, cerca de 70% de todas as doenças transmitidas de animais para humanos tiveram origem nos animais selvagens.
Questionados sobre as medidas já adotadas no Brasil, 69% dos entrevistados afirmaram que apoiariam um “melhor rastreamento e monitoramento do comércio de vida silvestre no país”; 65%, a criação de “leis mais fortes para reduzir o comércio de animais silvestres no país; 64%, “mais investimento nas fiscalizações de fronteiras”; e 47%, “protocolos sanitários mais rigorosos para o comércio de animais silvestres”.
Para João Almeida, essa foi uma sinalização positiva. “É bom saber que os brasileiros, em grande medida, apoiam medidas de controle da prática comercial com a vida silvestre, seja através da criação de novos regulamentos e ações protetivas da fauna, seja via aumento dos protocolos de controle sanitário, seja via aumento dos monitoramentos e fiscalizações”.Saber que muitos brasileiros apoiam isso aumenta muito a chance de projetos de lei e de políticas públicas lideradas pelo governo virem a caminhar para a frente, inclusive por uma questão de popularidade das lideranças políticas, “que dá aquela sensação de esperança, de acreditar que dá para acontecer”, afirmou.
O estudo foi desenvolvido como parte da campanha mundial #MeDeixaSerSelvagem, da WAP, cujo objetivo é exigir dos líderes dos países do G-20, grupo das 20 maiores economias do planeta, o fim do comércio global de animais silvestres. No dia 21 de novembro, quando se comemora o Dia de Combate ao Comércio Mundial de Animais Silvestres, a WAP fará várias ações para aumentar a visibilidade da campanha.
O propósito é tentar influenciar e engajar os líderes do G-20 na discussão sobre o fim do comércio internacional de vida silvestre, como medida preventiva para garantir também estabilidade econômica. Diante da recessão mundial provocada pela covid-19, João Almeida destacou que os líderes têm interesse em discutir soluções para a economia global. "Nesse sentido, o comércio de vida silvestre, como prática que aproxima animais silvestres de humanos, deve entrar na pauta como algo importante, e o G-20 sair de sua reunião anual com deliberações que levem à redução e controle dos níveis de comércio internacional entre as economias do bloco e dos países que participam do grupo."
No próximo mês, serão feitas projeções com mensagens-chave da campanha e imagens de animais silvestres, para que as lideranças brasileiras, em especial, entendam a importância de priorizar essa pauta para ser discutida pelos países do G-20.
Edição: Nádia Franco
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